sexta-feira, 27 de outubro de 2017

MEU TEMPO DE CRIANÇA NOS SERINGAIS DO RIO MURU (Parte 1)

Txai Antônio Macedo
Crônicas Indigenistas


Começa aqui, a partir deste texto, uma série de memórias que marcaram este personagem que vos escreve. Acompanhe as travessuras desse amigo de todos vocês através deste espaço de crônicas indigenistas...

 O que penso da palavra saudade? Bem, meu tempo de criança às vezes me dá saudades... Ás vezes não. Na minha concepção, saudade é palavra triste do ponto de vista da perda ou distância de alguma coisa infalível, ou uma maneira de lembrar com alegria, pessoas ou momentos vividos. Se assemelha a faca que corta nos dois gumes.

Abro essa conversa aqui falando de mim mesmo, e dos meus tempos vividos de infância nos seringais do Aquiry. Graças a Deus, não perdi um grande amor, nesta estrada longa da vida, e mesmo assim, vou chorando a minha dor, igual uma borboleta, vagando por sobre a flor.

Nasci na colocação Bagaceira do Seringal Transval da bacia do Rio Muru, no Município de Tarauacá – Estado do Acre. Antes mesmo de fazer o primeiro aniversário, fui me banhar de cinzas do fogão de lenha que minha mãe jogava debaixo do jirau de lavar pratos. A gente nem sabia que se chamava de 'louças'. Minha mãe é quem servia os pratos de todos e a mesa da nossa casa era o chão da casa, o assoalho como falamos no seringal.

Muita cinza debaixo do jirau. Eis um atrativo forte para experimentar um banho nas cinzas. Estava todo lambuzado de cinzas, quando minha mãe viu e gritou comigo. Claro que me assustei e sai correndo, tentei pular uma cerca, mas, segundos depois - segundo me contaram minhas irmãs mais velhas - cai por cima do braço direito, o que me fez quebrar o braço.

 Minha mãe ficou extremamente aflita e correu para floresta, indo buscar 'leite' de Janaguba. Essa árvore produz um látex na casca, que funciona como gesso. Assim, rapidamente ela envolveu meu braço com algodão da nossa lavoura empapado com aquele leite da árvore e emendou o meu braço.

Naquela época, crianças não brincavam na presença dos adultos. Não tomavam parte nas conversas e nem ficavam andando 'pelo meio' deles, enquanto os adultos conversavam. Crianças não podiam ter opinião e muito menos destacar propostas.

Um belo dia, segundo o que as minhas irmãs me contaram, eu quebrei toda ordem da casa, lançando um protesto sutil e pertinente. Eu ainda contava somente um ano de idade. Minha mãe colocou a panela de comida perto dela e foi aos poucos servindo os pratos de todos, no chão da casa. No entanto, ela esqueceu de colocar carne no meu prato, que problema! Eu olhei a mesa toda reunida então falei as seguintes palavras, que nem sei de onde tirei: "Você vai pirão sem carne, sem carne mesmo mais você vai". - Nossa! Isto virou motivo de muita alegria por parte da minha mãe, que sensibilizada e até emocionada, serviu meu prato pedindo mil desculpas. Esse acontecimento serviu de graça e ficou na boca de nossa família por muitos anos.

 Mas temos as lembranças ruins e tristes...

Numa certa noite de festa, que se realizava em outra colocação do mesmo seringal Transval, um sujeito chamado Pedro Elias assassinou o meu irmão Francisco Manuel. Foi por ciúmes, porque meu irmão era bem aceito pelas moças com quem ele sempre dançava por ocasião das festas naquele seringal.

Sua morte foi a gota d’água para que meu pai e minha mãe se mudassem com toda família daquele lugar. E assim nos mudamos para a cidade de Tarauacá, onde fomos morar numa casa improvisada na rua da Anhinga. Não sei se atualmente ainda é este o nome daquela rua, talvez ainda seja o mesmo.

Dessa época me recordo de poucas coisas. Lembro do botequim do seu Antonio Sabino, onde meu pai comprava mantimentos, e de poucos outros incidentes fortes que, enquanto criança, me envolveram. Relembro alguns...

Eu criava um macaco prego. Ele se chamava Miguel. Ele mexia muito em tudo: comia o açúcar e derramava outras coisas, e o povo da família me enchia o saco por causa dele. Infelizmente aconteceu uma fatalidade, que nem sei se devo contar. Enfim... De tanto reclamarem do macaco, numa daquelas vezes que mexeu no açúcar da lata, e por causa das reclamações contra ele, fiquei totalmente perdido e bati na cabeça do Miguel, que não obedecia e não largava de mexer nas coisas. Ele escapou mais depois morreu. Nossa! Guardo até hoje o meu sofrimento por ter sido levado a espancar o coitado do macaco, como eu via os adultos fazerem com os animais, que merda.

Uma outra lembrança envolveu o senhor Antonio Sabino, que tinha uma filha moça que se chamava Maria Sabino. Eu era uma criança mesmo, mas, quando aquela moça falava ali perto de mim e até me acariciava, eu sentia fortes emoções. Aquilo era mesmo muito forte em mim. Eu ainda não conhecia a palavra paixão, mas, hoje entendo que me apaixonei antes mesmo dos meus primeiros três anos de idade. E a moça comigo o tempo inteiro e dizia coisas que ficavam cantarolando na minha cabeça, mas, para ela tudo era uma brincadeira mesmo.

Eu ainda não havia completado meus primeiros três aninhos e já queria ser grande, digo, ser adulto. Ainda com essa idade, certo dia, brincando, encontrei um canivete inoxidável daqueles que abre e recolhe a  lâmina de forma manual. Lembro que minha sede de vingança foi aguçada em questão de instantes e ai veio-me a mente o famigerado Pedro Elias, o homem que tinha assassinado o meu irmão. Ele estava preso na cadeia da cidade de Tarauacá e minha cabeça repetia, a todo momento, as palavras de minha mãe e minhas irmãs sobre a morte de meu irmão, que na verdade, nem cheguei a conhecer.

Assim, sem que minha família percebesse, peguei o canivete e me dirigi à Delegacia, que era a cadeia como se chamava ali. Sabia que lá estava o homem que matou o meu irmão, e eu com aquele canivete no bolso tinha uma boa oportunidade de vingar a morte do meu irmão. Com tal intenção parti para a cadeia, e ao chegar lá, logo à porta, fui surpreendido pelo Cabo Joaquim, um Policial da Guarda Territorial e amigo da minha família. O cabo, ao me ver ali, e daquele tamanho, veio ao meu encontro. Me abraçou, colocou-me em seus braços, tirou o canivete do meu bolso e foi me deixar em casa, me levando em seus braços. Ao chegar à nossa casa ele entregou o canivete ao meu pai, e procurou recomendar aos meus familiares que não me deixassem sair de casa. Vi minha tentativa de vingança frustrada, e notei que meu pai também ficou preocupado com aquilo que fiz na minha infância matutina.

Naquela época meu pai, Raimundo Batista de Macêdo, mantinha a família ali na cidade e trabalhava no seringal. Ele comprou do Cícero Kaxinawá a colocação Foz do Igarapé do Caucho. E aí, aos três anos de idade, fui levado pela família a morar junto com o povo Kaxinawá. Essa colocação, hoje em dia, é a Terra Indígena Kaxinawá do Igarapé do Caucho.

Para mim, viver ali, ainda em idade tão tenra, não foi fácil. Bem no inicio de nosso relacionamento com os 'caboclos' - como os não índios os tratavam - dava para sentir que tudo ali era muito diferente da vida que eu levava na minha casa: as comidas, as bebidas, a maneira de preparar os alimentos, a forma de plantio das lavouras, a maneira como os indígenas tratavam seus mortos, como se dava suas festas. - Naquela época não me lembro de ter visto um Mariri.

Naquele tempo, os Huni Kuin (Kaxinawá) do Caucho já faziam festas dançantes tocadas com instrumentos, como: acordeão, cavaquinho, violão, pandeiro e maracá.  Eles trabalhavam na diária para os brancos da redondeza e contratavam dois irmãos cearenses e tocadores de acordeão, Isídio e Simão, que moravam na cidade de Tarauacá, para tocar em suas festas na aldeia.

Mesmo ainda uma criança dancei naquelas festas, que, por sinal, muito animadas. Isso quando não aconteciam brigas entre índios e não índios, o que, graças a Deus, nunca aconteceu com nossa família, afinal, meus pais eram amigos dos índios.
Lembro que numa dessas festas, realizada na aldeia Kaxinawá do Seringal Tamandaré, houve uma briga, e um senhor de nome José Berto Lino matou a facadas o 'caboclo' Serrano Kaxinawa. Da nossa família não tinha ninguém naquela festa e ainda bem que não estávamos, pois nos falaram que a briga foi feia.

Os Huni Kuin sempre se mostraram muito animados, gostavam muito de festa, naquela época, tempo dos seringais. Embora guardassem com eles muito de seus saberes tradicionais, viviam como os seringueiros regionais, e não me lembro que eles tenham nos mostrado a época festas de sua própria cultura, o que atualmente se observa, está bem recuperada e praticada conforme a tradição deste povo.




Antônio Batista de Macêdo, o Txai Macêdo, é sertanista da FUNAI e uma figura importantíssima para o indigenismo e para os povos indígenas no Acre. Juntamente figuras como com Txai Terri, Dedê Maia foi (e continua sendo) uma memória viva do que foram os anos de luta, desafios, vitórias, alegrias e tristezas em prol das questões indígenas nesse rincão da Amazônia. Vivas a esse grande txai, cuja história merece ser contada e recontada por quem  admira e conhece o seu trabalho. (Jairo Lima)

terça-feira, 24 de outubro de 2017

O PROBLEMÁTICO CONCEITO DE IDEOLOGIA

Inês Lacerda Araújo
Filosofia de todo dia

Quais são as raízes de nosso pensamento?
São várias e diversas: carga genética, experiências de vida, emoções, aprendizado, influência do meio social e familiar, escolarização, entre outras; cada uma delas, a seu modo, influenciará o modo de pensar e de ver o mundo, desde a infância e em especial na idade adulta.
E quanto à ideologia?
Mas antes, o que vem a ser "ideologia"?
Em um sentido positivo, são as ideias e conceitos que moldam a produção intelectual, as visões políticas, inclusive as metáforas e a simbolização da linguagem, e até mesmo certas utopias.
Vista dessa maneira, trata-se de um conteúdo formado basicamente por ideias que podem ajudar partidos e sistemas políticos a formular e a aplicar um ideário que pode e deve ser aberto às discussões, ao aperfeiçoamento dos objetivos políticos e sociais, e, principalmente, a leitura de sua época, às exigências de seu tempo.
Em flagrante contraponto a essa modo de ver e de usar as ideologias, prepondera a radicalização.
Em primeiro lugar, a imposição de um conjunto de propostas que não passam pelo exame crítico, pelo contrário, iludem, mascaram, seu objetivo é se transformar em única bandeira de luta, com prévios acertos sobre o que entendem ser a realidade social e política, capaz de produzir o que Marx chamara de "falsa consciência".
Essas ideologias visivelmente tendenciosas, conduzem aos extremismos de direita e de esquerda. Os de direita distorcem a realidade em prol do conservadorismo, da resistência às mudanças que a própria vida em sociedade produz. Se a sociedade evolui em direção à tolerância religiosa, por exemplo, os ideólogos de direita consideram que há um só credo "verdadeiro", o seu!
E as ideologias de esquerda consideram que o capital, que a burguesia, que a classe dominante também domina ideologicamente e impõe de cima a baixo seus conceitos, ideias e concepções políticas. Não conseguem pensar a realidade social fora do esquematismo "burguesia x trabalho". Que o socialismo é o único regime que resolverá a contradição, que acabará com o lucro ("mais valia") do capitalismo, intrinsecamente mau. Os olhos se fecham para a realidade histórica.

***

Em seu último boletim, a ANDES traz um artigo sobre o legado do direito soviético, como "a obrigatoriedade do trabalho, o que fez da URSS o primeiro lugar do mundo em que toda a população teve garantidas as condições para reprodução de sua vida" (...) e, paulatinamente, reduzir a jornada de trabalho, ao contrário do que acontece nas sociedades capitalistas, onde o Direito do Trabalho tem como foco garantir a extração da mais-valia" (p. 16). É um resumo da pesquisa do professor docente de Direito da Universidade Federal de Lavras, Gustavo Seferian.
É um caso evidente de distorção ideológica, só para ilustrar o direito do trabalho surgiu na Europa, nos EUA e também no Brasil sem nenhuma lei que promova o lucro. Mais adiante nesse artigo, reconhece que Stálin foi um contrarrevolucionário. Mas que felizmente também o "Direito é passível de alterações (sic), não só as favoráveis à burguesia, mas também alterações que são reflexo das ofensivas e resistências dos trabalhadores".
Esse discurso ideológico eivado de conceitos que nem Marx usaria, predomina ainda em vários setores da inteligenzzia universitária.

sexta-feira, 20 de outubro de 2017

ORAÇÃO À SANTÍSSIMA RUÍNA DA CULTURA ACREANA

(para o dia da cultura fora de época)
João Veras


alimente mais os cupins do teatro hélio melo
não deixa apagar as labaredas do museu da borracha
esconda ainda mais o quadrilhodromo que escafedeu-se
ligue o ventilador sobre o centro de florestania que virou pó
ponha mais tapumes no espaço kaxinawá
destroce ainda mais a casa de leitura da gameleira
afaste mais ainda o leitor da biblioteca da floresta
ajude a trocar o nome da usina de artes
alague ainda mais o teatro recreio
suma com os escombros aquáticos do barco da afundação municipal
alimente os bichos da madeira do parque capitão ciríaco com os restos da finada igrejinha de nossa senhora da seringueira
instale mais split no teatrão nesse eterno verão sem teatro
jogue as chaves dos cadeados nas dragas de areia da ex praia do amapá
escureça ainda mais a casa dos povos da floresta
auxilie ainda mais para que o seringal bom destino possa se tornar como tanto deseja apenas um destino mal-assombrado
sistematize mais ainda o sistema estadual de cultura fantasma
aconselhe ainda mais o conselho de cultura mudo
tombe mais ainda o conselho do patrimônio cultural de vistas grossas
ofereça mais emprego de estátua para o movimento cultural bobo
cale ainda mais a boca da lei de cultura
muito mais que o nosso canto,
nossas expressões cênicas, literárias, plásticas, cinematográficas...
nossas memórias artísticas, nossos presentes ignorados
enterre ainda mais o “artista da terra” no fundo do poço escuro
e o promova à galeria dos esquecidos mortos célebres
jogue mais praga sobre o que não existe nos demais municípios
e não esqueça de derrubar o que ainda resta em pé
aproveite a ocasião e festeje esse governo sem graça
- esse da agência cultural dos amigos
e da ruína cultural do resto, dos demais
até que as eleições e suas licitações as reinaugurem
e tudo volte ao nosso paraíso de dante.
Amém.

P.S.: Não esqueça de juntar tudo isso e colocar no Museu da Ruína dos Povos Acreanos.

19.10.17

terça-feira, 17 de outubro de 2017

MITO DE MACUNAÍMA O DESOBEDIENTE*

          Quando Macunaíma ainda era criança seus irmãos sempre lhe estavam dizendo:
          – Nunca espies o sexo de mulher. É horrível. É perigoso. Foge dele.
Mas isso só servia para excitar mais a curiosidade do menino e o desejo de desobedecê-los.
Uma vez, andando pelos matos, Macunaíma encontrou uma árvore muito alta, mas seca, de tronco bastante grosso e escorregadio.
De um dos galhos daquela árvore, separado do corpo, pendia um sexo de mulher.
E mesmo seco e mirrado era tão horrível aquilo que Macunaíma viu logo não ser fruto enluado ou uma velha pele de morcego.
– Lá está um sexo de mulher!
Macunaíma então se transformou imediatamente num macaco-prego. E tentou escalar a árvore. E espiar de perto aquele sexo.
Mas o tronco era muito grosso e escorregadio. E seus braços de macaco eram muito curtos. E Macunaíma não conseguiu escalá-lo.
Transformou-se, por isso, num quati. E não conseguiu escalá-lo.
Transformou-se, ali mesmo, numa cobra. E também não conseguiu.
Transformou-se numa lagartixa. E nada conseguiu.
Transformou-se numa formiga. E, caminhando em zigue-zague, pelo tronco acima, bem devagar, chegou perto do sexo de mulher e pôde espiá-lo como queria.
Mas o sexo de mulher o descobriu. E, rápido, o engoliu.
Muitos dias depois os irmãos de Macunaíma, procurando-o pelos matos, ao passar por aquela árvore, viram o sexo de mulher, que conheciam, gordo e viçoso.
Desconfiaram. Puseram a árvore abaixo. Abriram aquele sexo. E ali acharam o corpo de Macunaíma. Sopraram sobre ele. E Macunaíma acordou, rindo, rindo.

PEREIRA, Nunes. Moronguêtá: um Decameron indígena (Vol.1). Rio de Janeiro: Civilização Brasileira; Brasília: INL, 1980. p.73
*Mitos, lendas, Estórias e Tradições dos Índios Taulipangue, Macuxi, Uapixana e Xiriana, do Vale do Rio Branco, Roraima.

segunda-feira, 16 de outubro de 2017

MEMÓRIA MUSICAL: CÉSAR ESCÓCIO

César Escócio é natural de Sena Madureira. Cantor e compositor, formado em Direito pela Universidade Federal do Pará, passou a morar em Belém, onde além de exercer a advocacia, dedica-se a compor e a cantar, especialmente na afirmação da cultura amazônica. Entre seus trabalhos, destacam-se o LP Caranã (1991) e o CD Omami Omami – Lutas populares na Amazônia (Coletiva) (1997).

O Dicionário Cravo Albin da Música Popular Brasileira traz os seguintes dados sobre Escócio: “Tem participação em movimentos e eventos artístico-musicais no Acre e no Pará, desde os anos 1970. Com diversas participações em gravações coletivas, lançou o LP solo “Caranã”, em 1995. Em 1997, produziu, em Belém, o CD “Omami Omami - Lutas populares na Amazônia”, do qual participaram compositores e músicos do Pará. Em 2000, participou do songbook “Canções Acreanas”, com a composição “Sou Fronteira”, parceria com o também acreano Océlio de Medeiros. O songbook, que foi publicado sem fins lucrativos, e que faz parte do Projeto “Caderno de Músicas Acreanas”, teve apoio de empresas oficiais como o Banco do Brasil, além de outras, de iniciativa privada, tendo por objetivo tornar pública a produção musical acreana. O compêndio é o registro fonográfico, através de um CD, e gráfico, contendo melodia, letra, harmonia e arranjos instrumentais, além de pequena biografia dos compositores e, também, avaliações de personalidades acreanas, como João Veras, que o idealizou e produziu, Francisco Dandão, Silvio Margarido, Romualdo Silva Medeiros e Danilo de S'Acre.”

O LP Caranã foi gravado e mixado entre março e junho de 1991, nos estúdios “TRANZATAPE”, 16 canais, em Belém do Pará. A ilustração da capa é uma pintura de Jorge Eiró, concebida especialmente para o LP, que contou com músicos como Sagica, Zé Luiz Maneschy, Silvana de Faria, Alcir Meireles, Ricardo Dias, Marianne, Paulo Levi, Luiz Pardal, Joba, Suelene e Nicinha, etc.
Capa de Caranã (1991)


Contracapa de Caranã (1991)
Cartaz da apresentação Made in seringal de César Escócio com a Banda Látex em Rio Branco em 1989.

Detalhe folder de Made in seringal

Folder do show Made in seringal (1989)

Letras de algumas músicas que se encontram no LP Caranã:

CARANÃ
César Escócio

Caraná
É o verão se achegando
Natureza afora
É um povo migrante
Que foge do tédio
Que foge do vício
Da cidade
Que busca o sopro do mar
Nas delícias da água
Na malícia das ondas
Nas crinas de um sol vermelho
Nas denguices de uma noite enluarada
Caranã
É a rosa das dunas originando as fontes
Despertando os cânticos
É Atalaia numa tatuagem viva
Trançada de gente
Que nem o arco-íris à beira do mar
Caranã
É o farol vermelho vagalumeando
No avisar da rota ao bom pescador
Que vem de tão longe
De dentro da noite
De volta pro seu amor
Caraná
É um tapiri de palha
Perto da ladeira, onde se dança
De onde se vê o verão
De onde se avista o porto
E o maçarico
E a gaivota
E a ponta de areia que entra no mar
Caraná
Somos nós e uma lua a brilhar
Somos nós e o sopro do mar
São as veias da terra a jorrar
Cristalinas salinas
Ah minha amada!
São promessas de amor
No olhar.


NORTEANDO
César Escócio

Norte andei
Selvamar
No reflorir do ipê
No dia da luamar
No céu fumacê
Pintou de novo a maré
Cunhã foi pro igarapé
Traçando seus tucumãs
Mirando-se nas manhãs
Nas águas de abaeté
Num barco faz sua fé
Pra retornar – Marajó
E não ficar assim tão só
Na linha do equador
Pensando no seu amor
Além de lá
O rio
O cheiro-ribeira
Cavalo do rio
Canoa ligeira
Eh, canoa!
Repique da maresia
Saudade agonia
Cuíra
Remanso de lua
Corações se buscam
Sem distância de amar
Em cada porto-cidade
Há uma espera-miragem
Em avidez, liberdade
Trabalho, fé e coragem
Em refazer o pão
Atravessando o verão


CÉU DO AQUIRY
César Escócio

Mirei
Mirei muchacha
Mira tu rambém
O cintilar das estrelas
Lindas no céu do aquiry

Canta toda essa beleza
Esse cheiro de mato
Que navega no ar

Canta pela natureza
E saúda os povos
Dessa floresta acesa
Pela luz da lua
Fogo do prazer

Mirei...


SOPRO AMAZÔNICO
César Escócio

Vociferar
A mata e seus mistérios
O verdejar desponta
Na ponta do olhar
Tanto chão
Quanta distância pra vencer
O céu e suas nuvens
Entre galhos e espinhos e rios
As vozes da mata
Numa canção selvagem
O sopro amazônico
Num verde forte refrão
Filhos desse império
Aldeias e tabocais
Tapuias e curumins
Araras e paxiubais
Serpentes e jacamins


RAINHA DA FLORESTA
Pia Vila, Felie Jardim e Txai Terry Aquino

Senhora rainha da floresta
Dai-me a força da ayawuasca
Pra cantar nessas malocas
Pros índios desse lugar

Quero beber caiçuma
E tomar muito cipó
Quero bailar o mariri
Nas aldeias do aquiry

Dai-me a força do jagube
Na luz do lampião
Iluminando todas as veredas
Que dão pro meu coração

Como é grande essa floresta
É maior a solidão
Dessa vida passageira
Desse verde sertão

Vou seguindo pela vida
Varejando de ubá
Todos os rios dessa terra
Unidos chegarão ao mar... 


Nossa homenagem ao artista César Escócio e o nosso agradecimento ao amigo João Veras.