sexta-feira, 23 de maio de 2014

RELIGIÃO E CIÊNCIA

Inês Lacerda Araújo


Uma das mais fundamentais e remotas necessidades da humanidade foi o culto aos deuses, às forças naturais, às manifestações misteriosas. Aos poucos os sacrifícios prestados a tais elementos a fim de restaurar o equilíbrio e apaziguar inimigos, foi sendo alçado a um nível superior, o de um só ser, absoluto, transcendente, todo-poderoso, numa palavra, Deus.

O monoteísmo prevalece na maioria das religiões, e, por sua vez, as religiões se mantêm firmes e influentes, mesmo nas atuais culturas e sociedades. Podem levar a barbarismos como certo "islamismo" radical, caso do grupo terrorista que sequestrou meninas na Nigéria, o Boko Haram, sob o pretexto absurdo de que meninas não podem ir à escola!!!, a guerras, espalhar morte e ódio.

São exceções, pois religiões podem e devem cumprir outras funções, levar à paz, espalhar solidariedade, ajuda humanitária, conforto interior. E esse é o papel esperado das diversas crenças religiosas, fiéis seguem seus preceitos, oram, encontram nos textos sagrados a verdade revelada e por isso mesmo, incontestável.

A fé é uma das dimensões da vida humana, outros produtos culturais não a substituem pois apenas religiões levam ao encontro com o sagrado e o divino, além do humano. Não é preciso provar nada, e sim vivenciar a crença.

Por isso mesmo, não faz sentido algum obrigar alguém a crer e nem impor uma religião. Infelizmente, há muita manipulação e forte indução em certas seitas, mas sempre cabe à pessoa aceitar ou não esse tipo de pressão.

Por todas essas razões, a ciência não pode ser posta no lugar da crença em entes superiores e divinos, muito menos o inverso, crer em vez de conhecer.

Revelação e prova científica são antípodas, inteiramente diversas, uma não pode substituir a outra.

A ciência requer um tipo de conhecimento que, inclusive, não é uniforme, há tipos de ciência, a biológica (Biologia, Medicina), a natural (Física, Química), as ciências humanas e sociais (História, Sociologia), as da comunicação, as da informação, as matemáticas, a Economia. É preciso haver pesquisa, resultados, métodos, verificação, publicidade nos resultados, uma linguagem tradutível por meio de cálculos, símbolos, estatísticas, provas laboratoriais. As ciências progridem e estão em constante mudança. Podem também produzir guerra, morticínio, devastações, como a bomba nuclear, experimentos com vacinas e medicamentos (nazistas com os judeus e laboratórios nos EUA com negros).

A teoria da evolução de Darwin, a teoria da relatividade de Einstein, as concepções de que somos feitos de células, organismos que evoluíram, que somos dotados de um psiquismo, neurônios, sinapses, enfim, que há um universo em expansão e que nosso organismo e nosso cérebro são objeto de pesquisa e que há muito, muito mesmo ainda desconhecido - tudo isso é matéria de ensino, ciência, pesquisa.

Não há impedimento algum e nem incompatibilidade com religião alguma, ensinar princípios, métodos e resultados das ciências, em níveis que acompanham os graus de compreensão dos alunos.

É possível e condizente com a educação, os alunos ficarem cientes de que há tipos de questionamento. Um questionamento sobre nossa origem pode ser respondido por meio de verdade revelada (o professor expõe para a criança ou para o jovem certo tipo de fé ou de religião), e por meio de ciência em constante mudança com novas teorias, com novos instrumentos e novas necessidades sociais e econômicas.

Educar é alargar horizontes, esclarecer, instruir, informar e, principalmente, formar pessoas responsáveis, abertas, livres para pensar e decidir.

Nietzsche em Humano, demasiado humano escreve:
Aforismo 128: Promessas da ciência

“A ciência moderna pretende diminuir a dor tanto quanto possível, uma vida tão longa quanto possível, isto é, um tipo de felicidade eterna, muito modesta, é fato, em comparação com as promessas da religião”.

Essa reflexão, extremamente crítica, infelizmente não é feita nem na escola, nem pelas religiões.


INÊS LACERDA ARAÚJO - filósofa, escritora e professora aposentada da UFPR e PUCPR.

Nenhum comentário: